Registro do ato de tombamento definitivo, sem conteúdo financeiro (conclusão)

(da série Registros sobre Registros, n. 377) 

                                                      Des. Ricardo Dip

1.144.  Dando sequência ao breve estudo que por agora dedicamos ao registro predial do ato de tombamento, examinemos um tanto as disposições do Decreto-lei 25, de 30 de novembro de 1937.

Esse diploma normativo tem por fim organizar a proteção do patrimônio histórico e artístico do Brasil, patrimônio que compreende, na definição constante do caput do art. 1º desse referido Decreto-lei 25, «o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico».

Depois de mencionar a instituição dos livros do tombo (§ 1º do art. 1º e art. 4º), o Decreto-lei 25 prevê que «o tombamento dos bens pertencentes à União, aos Estados e aos Municípios se fará de ofício, por ordem do diretor do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, mas deverá ser notificado à entidade a quem pertencer, ou sob cuja guarda estiver a coisa tombada, a fim de produzir os necessários efeitos» (art. 5º), prevendo, em seguida, que o tombamento de coisa de domínio de pessoa natural ou jurídica de direito privado se faça quer voluntária, quer compulsoriamente (art. 6º), disciplinando então o processo, quanto ao tombamento compulsório (art. 9º).

Em seu art. 10, o Decreto-lei 25 distingue, de um lado, o tombamento provisório (que se dá com a notificação no âmbito do processo referido no art. 9º), e, de outro lado, o tombamento definitivo −o «concluído pela inscrição dos referidos bens no competente Livro do Tombo». Lembremo-nos neste passo que o registro stricto sensu do tombamento no ofício imobiliário é o correspondente ao tombo definitivo; caberá averbação do processo, entretanto, inscrevendo-se o tombamento provisório (item 36 do inc. II do art. 167 da Lei 6.015).

A previsão do que agora corresponde ao registro em sentido estrito já constava do art. 13 do mesmo Decreto-lei 25: «O tombamento definitivo dos bens de propriedade particular será, por iniciativa do órgão competente do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, transcrito para os devidos efeitos em livro a cargo dos oficiais do registro de imóveis e averbado ao lado da transcrição do domínio».

Há um dispositivo no Decreto-lei 25 que excepciona a ordinária falta de cominação de penalidades pela falta do registro. Com efeito, o art. 169 da Lei 6.015 −prevendo que todos os atos alistados no art. 167 da mesma lei são de inscrição obrigatória− não tem, de comum, sanção expressa; o que há é uma eventual pretensão indenitária de quem se repute prejudicado, no plano patrimonial, pela míngua do registro. Todavia, a falta −ou até o só retardamento− do registro do tombamento definitivo de imóveis de domínio particular atrai uma penalidade de multa, nos termos do que dispõem o § 1º do art. 13 do Decreto-lei 25: «No caso de transferência de propriedade dos bens de que trata este artigo, deverá o adquirente, dentro do prazo de trinta dias, sob pena de multa de dez por cento sobre o respectivo valor, fazê-la constar do registro, ainda que se trate de transmissão judicial ou causa mortis».

Interessa de algum modo ao registro predial o tema da construção e da demolição relativas a imóvel tombado. Ainda que aparente não ter direto interesse ao registro de imóveis, o art. 20 do Decreto-lei 25 trata da vigilância dos bens tombados. Lê-se nesse dispositivo: «As coisas tombadas ficam sujeitas à vigilância permanente do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, que poderá inspecioná-los sempre que for julgado conveniente, não podendo os respectivos proprietários ou responsáveis criar obstáculos à inspeção, sob pena de multa de cem mil réis, elevada ao dobro em caso de reincidência».

Calha que, cabendo ao ofício de imóveis averbar a edificação e a demolição de prédios (item 4 do inc. II do art. 167 da Lei 6.015), deve o registrador exigir, em caso de imóvel tombado, documento que confirme a autorização correspondente emanada pelo Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, coimo resulta do que enuncia o art. 18 do Decreto-lei 25: «Sem prévia autorização do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, não se poderá, na vizinhança da coisa tombada, fazer construção que lhe impeça ou reduza a visibilidade, nem nela colocar anúncios ou cartazes, sob pena de ser mandada destruir a obra ou retirar o objeto, impondo-se neste caso a multa de cinquenta por cento do valor do mesmo objeto».

Até a vigência do Código de processo civil de 2015, vigorava as disposições do Decreto-lei 25 acerca do direito de preferência quanto aos bens tombados, o que mais robustecia a necessidade de inscrever-se no ofício imobiliário, para benefício da dinâmica do registro (é dizer, de terceiros potenciais adquirentes), o tombamento quer provisório (realizando-se a averbação cabível), quer definitivo. Dispunha assim o caput do art. 22 do Decreto-lei 25: «Em face da alienação onerosa de bens tombados, pertencentes a pessoas naturais ou a pessoas jurídicas de direito privado, a União, os Estados e os municípios terão, nesta ordem, o direito de preferência». E davam sequência a isso os §§ 1º e 2º do mesmo art. 22:

  • § 1º «Tal alienação não será permitida, sem que previamente sejam os bens oferecidos, pelo mesmo preço, à União, bem como ao Estado e ao município em que se encontrarem. O proprietário deverá notificar os titulares do direito de preferência a usá-lo, dentro de trinta dias, sob pena de perdê-lo
  • § 2º «É nula alienação realizada com violação do disposto no parágrafo anterior, ficando qualquer dos titulares do direito de preferência habilitado a sequestrar a coisa e a impor a multa de vinte por cento do seu valor ao transmitente e ao adquirente, que serão por ela solidariamente responsáveis. A nulidade será pronunciada, na forma da lei, pelo juiz que conceder o sequestro, o qual só será levantado depois de paga a multa e se qualquer dos titulares do direito de preferência não tiver adquirido a coisa no prazo de trinta dias

Cabe assinalar que esse direito de preferência não impedia pudesse o proprietário gravar livremente o imóvel tombado por meio penhor, anticrese ou hipoteca (§ 3º do art. 22 do Decreto-lei 25).

Conforme ficou dito, esse direito de preferência foi revogado −de maneira expressa− pelo Código de processo civil de 2015, tal se lê em seu art. 1.072, que é seu derradeiro dispositivo que indica, entre outras revogações, a do «art. 22 do Decreto-lei nº 25, de 30 de novembro de 1937» (inc. I).