(da série Registros sobre Registros, n. 385)
Des. Ricardo Dip
1.153. O item 3º do inciso II do art. 167 da Lei 6.015, de 1973, prevê a averbação «dos contratos de promessa de compra e venda, das cessões e das promessas de cessão a que alude o Decreto-lei nº 58, de 10 de dezembro de 1937, quando o loteamento se tiver formalizado anteriormente à vigência desta Lei».
A hipótese a que se refere esse dispositivo diz respeito, pois,
• a contratos de promessa de compra e venda, de cessões e de promessas de cessão,
• não quaisquer, mas objeto do Decreto-lei 58 (de 10-12-1937),
• desde que o loteamento se tivesse formalizado antes da vigência da mencionada Lei 6.015.
Nos termos do Decreto-lei 58, cabia ao proprietário de imóveis −tanto urbanos, quanto rurais−, na hipótese de pretender vendê-los «divididos em lotes e por oferta pública, mediante pagamento do preço a prazo em prestações sucessivas e periódicas» (art. 1º), apresentar, para depósito no cartório do registo de imóveis competente, um memorial −cujos requisitos a normativa alistava (inc. I do art. 1º)− e uma planta (inc. II do mesmo art. 1º), além de outros documentos (certidões e exemplar de caderneta ou do contrato-tipo de compromisso de venda dos lotes).
Com essa apresentação, iniciava-se um processo especial de registro, como se lê no art. 2º do Decreto-lei 58: «Recebidos o memorial e os documentos mencionados no art. 1º, o oficial do registo dará recibo ao depositante e, depois de autuá-los e verificar a sua conformidade com a lei, tornará público o depósito por edital afixado no lugar do costume e publicado três vezes, durante 10 dias, no jornal oficial do Estado e em jornal da sede da comarca, ou que nesta circule».
Esse processo especial ultimava-se com uma inscrição em um livro auxiliar próprio (art. 4º do Decreto-lei 58), no qual livro também se averbavam os «contratos de compromisso de venda e de financiamento, suas transferências e rescisões». Assinale-se que essa averbação atribuía «ao compromissário direito real oponível a terceiros, quanto à alienação ou oneração posterior (…)» (art. 5º). Além dessa inscrição e das averbações referidas, cabia ainda averbar-se no então existente livro 3 (livro das transcrições) a inscrição do loteamento lançada no aludido livro auxiliar.
Duas coisas que parece convir mencionarem-se. Primeira, a de que o Decreto-lei 58 previa, no processo especial de inscrição do loteamento, a dúvida ex officio −isto é, independente de requerimento para suscitação (cf. a segunda parte do § 1º do art. 2º). Segunda, a de que a inscrição imobiliária do loteamento afetava −tornando-as inalienáveis− «as vias de comunicação e os espaços livres constantes do memorial e da planta» do loteamento (art. 3º).
O referido Decreto-lei 58, de 1937, dispondo acerca do loteamento e da venda de terrenos para pagamento em prestações, versava, de maneira principal, em seu art. 11, sobre o compromisso de venda e compra. Lê-se nesse dispositivo que pode o referido ajuste documentar-se por instrumento público ou particular (caput), do qual constem, obrigatoriamente,
• o nome, a nacionalidade, o estado civil e o domicílio dos contratantes;
• a denominação e a situação dominial do imóvel, com o número e a data da inscrição correspondente;
• a descrição do lote objeto do compromisso, com suas confrontações, indicação de áreas e de outras características, além de apontar-se o número correspondente na planta arquivada no cartório;
• o preço, o prazo e a forma de pagamento, mencionando-se o valor do sinal;
• os juros relativos ao débito em aberto e as prestações vencidas e não pagas;
• a cláusula penal (que não poderia superar 10% do débito, e que, para efetivar-se, exige intervenção judicial);
• a declaração da existência ou inexistência de servidão ativa ou passiva e outros ônus reais e outras restrições ao direito de propriedade;
• a indicação do contratante a quem incumbe o pagamento das taxas e impostos.
O mesmo art. 11 do Decreto-lei 58 previa pudesse o contrato de promessa de compra e venda ser «manuscrito, datilografado ou impresso, com espaços em branco preenchíveis em cada caso» (§ 1º), elaborando-se em duas vias, que devem ser assinadas pelas partes e por duas testemunhas, com reconhecimento de firmas por tabelião.
Tanto que lavradas, essas vias teriam de entregar-se −dentro no prazo de dez dias− ao oficial do registro de imóveis competente, de sorte que ele averbasse o título e restituísse ambas as vias, «devidamente anotadas a cada uma das partes» (§ 1º). Saliente-se que a norma exigia a apresentação das duas vias do contrato e chegava a referir, no plural, a prática do ato registral correspondente («averbá-las»). O objetivo não era, em rigor, o de atender à operação mesma do registro, porque a tanto suficiente apenas uma das vias do ajuste, mas, isto sim, documentar o ato para ambas as partes contratantes.
Exigiam-se a outorga uxória −suposto fosse casado o vendedor (§ 2º do art. 11)− e que as procurações que se houvesse passado pelos contratantes estivessem já ou fossem arquivadas no cartório imobiliário (§ 3º).
Note-se que a averbação aqui examinada diz apenas respeito aos contratos de promessa de compra e venda, de cessões e de promessas de cessão, objeto do Decreto-lei 58, porque a Lei 6.015 prevê o registro stricto sensu demais «contratos de compromisso de compra e venda de cessão deste e de promessa de cessão, com ou sem cláusula de arrependimento, que tenham por objeto imóveis não loteados e cujo preço tenha sido pago no ato de sua celebração, ou deva sê-lo a prazo, de uma só vez ou em prestações» (item 9º do inc. I do art. 167).
Por fim, atenda-se a que o item 3º do inciso II do art. 167 da Lei 6.015 prevê a averbação dos contratos objeto do Decreto-lei 58, «quando o loteamento se tiver formalizado anteriormente à vigência» da mesma Lei 6.015, ou seja, precedentemente a 1º de janeiro de 1976 (cf. art. 198 da Lei 6.015).