Averbação da mudança de denominação e de numeração dos prédios, da edificação, da reconstrução, da demolição, do desmembramento e do loteamento de imóveis (primeira parte)

(da série Registros sobre Registros n. 386)

                                                        Des. Ricardo Dip

1.183.  Diz-se frequentemente que o foco da atração do registro público imobiliário é o solo; para nosso caso, melhor se afirma: uma porção da crosta terrestre delimitada por linhas poligonais. O conceito de solo, todavia, não exaure o de bem imóvel: são bens imóveis, define o Código civil brasileiro de 2002, «o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente» (art. 79). A lei reputa ainda imóveis, sem que sejam os inamovíveis por natureza, «os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram» e «o direito à sucessão aberta» (art. 80). E, doutra parte, não perdem o caráter de imóvel −enuncia o art. 81 do Código− «as edificações que, separadas do solo, mas conservando a sua unidade, forem removidas para outro local»e «os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele se reempregarem».

           A noção de «imóvel» desfiada no aludido art. 79 do Código civil abrange, de uma parte, o imóvel por natureza (o solo) −ou seja, o bem carecedor de mobilidade material−, e, de outra parte, o imóvel por incorporação tanto natural (p.ex., árvores), quanto artificial (v.g., as edificações).

           A matriculação do imóvel −na expressão de Raúl García Coni, o début registral do imóvel− efetiva-se, em linha de princípio, no aspecto objetivo, por meio da determinação e da especialização do solo correspondente. Vale dizer que não se leva, ordinariamente, ao inventário inaugural da matrícula o imóvel por incorporação. Lê-se, a propósito, no n. 3 do item II do § 1º do art. 176 da Lei 6.015, de 1973, que a identificação do imóvel a matricular-se se fará com a indicação: «a - se rural, do código do imóvel, dos dados constantes do CCIR, da denominação e de suas características, confrontações, localização e área» e, «b - se urbano, de suas características e confrontações, localização, área, logradouro, número e de sua designação cadastral, se houver». 

           Poderá ocorrer, no entanto, que imóveis por incorporação já estejam mencionados em registro anterior, hipótese que lhe permitirá a referência no inventário inaugural da matrícula.

           Deve ainda considerar-se outra hipótese que foge à regra, hipótese essa relativa ao direito de laje: «A instituição do direito real de laje ocorrerá por meio da abertura de uma matrícula própria no registro de imóveis e por meio da averbação desse fato na matrícula da construção-base e nas matrículas de lajes anteriores, com remissão recíproca» (§ 9º do art. 176 da Lei 6.015).

           Sendo o solo, pois, comumente, o elemento objetivo principal para inventariar-se na matrícula, isso não exclui hajam de atrair-se ao registro algumas indicações de imóveis por incorporação. Sendo, contudo, várias as possibilidades existenciais desses imóveis, tratou a lei de restringir as hipóteses de sua inscrição. É bem verdade que, em algumas situações, a referência a imóveis por incorporação frequentava, outrora, as descrições prediais: p.ex., a indicação de uma árvore por marco de confinamento. Mas atualmente a determinação imobiliária e, mais que ela, sua especialização abdicaram da referência a elementos que, ainda sendo imóveis incorporados, sejam facilmente mobilizáveis.

           Nesse quadro, o item 4º do inciso II do art. 167 da Lei 6.015, prescreve o averbamento da «mudança de denominação e de numeração dos prédios, da edificação, da reconstrução, da demolição, do desmembramento e do loteamento de imóveis».

           O tema da mudança de denominação é, em princípio, referível aos imóveis rurais, porque vem indicada a denominação entre seus elementos identitários, como já ficou dito: «se rural, do código do imóvel, dos dados constantes do CCIR, da denominação e de suas características, confrontações, localização e área» (alínea a do n. 3 do item II do § 1º do art. 176 da Lei 6.015). Embora hipótese bastante rara, nada impediria que a um imóvel urbano se tivesse atribuído uma denominação constante do registro, o que tornaria possível sua eventual mudança e a reflexa retificação do registro.

           Quanto à numeração dos prédios, é isso um fator de relevo para a mais cômoda identificação dos imóveis (mormente os urbanos, assim a referência constante da alínea b do n. 3 do item II do § 1º do art. 176 da Lei 6.015: « se urbano, de suas características e confrontações, localização, área, logradouro, número e de sua designação cadastral, se houver»). Essa indicação exige documento administrativo que a confirme.

           A edificação, a reconstrução e a demolição relativas ao solo têm importância para a identificação, mas, por igual, para o controle edilício e a incidência tributária.

           Compete aos municípios o controle das construções urbanas −cf. incisos I e VIII do art. 30 da Constituição brasileira de 1988: é da competência municipal «legislar sobre assuntos de interesse local» e «promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano».

           É da doutrina de Hely Lopes Meirelles que nada impede os municípios também tratarem das construções da zona rural, desde que se editem leis locais adequadas e limitadas às edificações, porque a regulação do uso e ocupação do solo rural é da competência federal (Direito municipal brasileiro, item 3.7).

           O mesmo e festejado autor distinguiu entre, de um lado, a construção −gênero abrangente de toda obra imobiliária, qualquer seja sua destinação− e, de outro lado, a edificação, que é obra destinada a uso humano. E ensina ainda que todas as construções urbanas estão sujeitas a um dúplice controle: urbanístico e estrutural. Daí que se exija a prévia aprovação do projeto construtivo pela administração municipal, expedindo-se o alvará de construção e, na sequência, o alvará de utilização, conhecido vulgarmente pela expressão «habite-se» (ou ainda carta de habitação), documento indispensável para a averbação edilícia.

           Prosseguiremos para referir o tema da chamada certidão negativa de débitos de obra (CND) e as derradeiras hipóteses previstas no item 4º do inciso II do art. 167 da Lei 6.015: desmembramento e loteamento.