Averbação da mudança de denominação e de numeração dos prédios, da edificação, da reconstrução, da demolição, do desmembramento e do loteamento de imóveis (conclusão)

(da série Registros sobre Registros n. 388)

                                                        Des. Ricardo Dip

1.185. A Lei 6.015, de 1973, prevê serem suscetíveis de registro stricto sensu os loteamentos urbanos e rurais (n. 19 do inciso I do art. 167), e, nada obstante, dispõe ainda, no item 4º do inciso II de seu art. 167, a averbação do desmembramento e do loteamento de imóveis.

           Essa dúplice previsão da Lei 6.015 quanto aos loteamentos pareceria responder às situações propiciadas por loteamentos anteriores à vigência da mesma Lei 6.015, em que se inscreviam esses parcelamentos em livro auxiliar especial (cf. art. 4º do Decreto-lei 58, de 10-12-1937). Mas outra solução aparenta ser agora a tendencial (por mais sempre possa haver alguma controvérsia), solução essa consistente em que não mais se averbe, em caso algum, um loteamento; ilustrativo, nesse sentido, é o que consta do item 9.b.4 do capítulo XX das largas e ainda expansivas Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo, que prevê averbáveis no ofício imobiliário a «mudança de denominação e de numeração dos prédios, edificação, reconstrução, demolição e desmembramento de imóveis», omitindo a referência ao loteamento (loteamento que consta do texto do item 4º do inciso II de seu art. 167 da Lei 6.015, de 1973).

           A Lei brasileira 6.766, de 19 de dezembro de 1979, dispondo sobre o parcelamento do solo urbano, definiu, em dois parágrafos de seu art. 2º, as noções de loteamento e desmembramento.

           Diz essa lei, quanto ao loteamento, ser ele «a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes» (§1º do art. 2º).

           E quanto ao desmembramento, conceitua-o: «a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique na (sic) abertura de novas vias e logradouros públicos, nem no prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes» (§ 2º do art. 2º).

           O desmembramento abrange o desdobro −que é, propriamente, antes uma simples categoria burocrática e não registral; a discussão acerca de aplicar-se ao desmembramento, segundo os casos, o processo do art. 19 da Lei 6.766 não tem influência para a caracterização do desdobro.

           Se, quanto aos loteamentos, após a vigência da Lei 6.766, é indeclinável o registro especial previsto nos arts. 18 e seguintes dessa lei, já quanto aos desmembramentos é possível, em dadas hipóteses, a dispensa desse registro −o que não significa a imunidade da aprovação urbanística (art. 12 da Lei 6.766). 

           Magistrados que, então, auxiliavam a Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo −vivíamos o ano de 1983− elaboraram interessante parecer atendendo a uma representação do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (Processo 66.129/83, sendo oficiantes os Juízes Hélio Lobo Júnior, Hélio Quaglia Barbosa, José Roberto Bedran e Narciso Orlandi Neto). Desse parecer −datado de 2 de maio de 1983−, aprovado pelo Des. Bruno Affonso de André, então Corregedor Geral a Justiça paulista, é relevante aqui destacar alguns excertos relativos ao tema do parcelamento do solo.

           Ali se lê que, entre as inovações estabelecidas com a Lei 6.766, de 1979, que, em dados limites, substituiu o Decreto-lei 58, de 1937, o desmembramento, para fins registrais, equiparou-se, postas algumas circunstâncias, ao loteamento. Recolhe-se do parecer:

«De fato, a Lei 6.766/79 assemelhou os desmembramentos aos loteamentos, quer traçando normas urbanísticas a ambos aplicáveis, quer exigindo, nos dois casos, o registro do parcelamento. O legislador deu aos desmembramentos o relevo que já haviam assumido na prática, como forma de urbanização, que, sem controle, é sensivelmente prejudicial ao desenvolvimento das cidades. Ao mesmo tempo, preocupou-se com as relações entre os proprietários e os adquirentes das parcelas de desmembramentos; à semelhança do que ocorre nos loteamentos, também os desmembramentos são feitos para venda a prazo; quando não, os adquirentes devem ainda gozar de proteção especial.»

           Com efeito, o art. 18 da Lei 6.766 prevê um processo de registro especial tanto para os loteamentos, quanto para os desmembramentos. Lê-se nesse dispositivo: «Aprovado o projeto de loteamento ou de desmembramento, o loteador deverá submetê-lo ao registro imobiliário dentro de 180 (cento e oitenta) dias, sob pena de caducidade da aprovação, acompanhado dos seguintes documentos»… e segue, então, o rol desses documentos.

           Observou ainda o mesmo parecer serem, então, «cada vez mais numerosos os pedidos de <averbação de desmembramentos>, com a formação, não raro, de até 12, 15 e 20 lotes (…)». E prosseguiu adiante o parecer:

«É fato incontroverso que a Lei 6.766/1979 deixou de ficar um parâmetro quantitativo, que pudesse servir de denominador distintivo para os casos de desmembramentos em que a necessidade do registro especial seria imperiosa.

Essa omissão legislativa, consoante concretamente constatado em correições, vem gerando os mais díspares entendimentos por parte dos Oficiais, alguns, com rigorismo desmedido, exigindo o procedimento de Registro Especial para desmembramentos de 3 lotes, e outros, excessivamente liberais, dispensando-o para parcelamentos de 10, 12 e, até mesmo 15 lotes, o que, sobremaneira prejudicial à uniformidade administrativa, estava a reclamar orientação superior que viesse, pelo menos, a recomendar diretrizes no sentido da mais fiel e harmônica execução da Lei 6.766/79.»

           E continua o parecer, indicando a necessidade da adoção de critérios objetivos, recolhidos em cada caso concreto, para exigir ou não o registro especial do desmembramento: «Dentre esses elementos de ordem objetiva, por certo sobressai o da quantidade de lotes parcelados, na medida em que diz de perto com o número de futuros e eventuais adquirentes, de significativo aspecto social quanto maior for». Por isso, conclui-se no parecer: «pequenos fracionamentos de terras, respeitado o aspecto urbanístico e desde que afastada a potencialidade de prejuízos a um maior número de adquirentes, podem ser dispensados do que se convencionou chamar Registro Especial».