As despedidas causadas pelo coronavírus, ou suspeita dele, já correspondem a 387 das 4.958 mortes registradas no estado
RIO - Dois em cada dez enterros ou cremações realizados este mês no Cemitério da Penitência, na Zona Norte do Rio, foram de casos confirmados ou sob investigação de Covid-19. As despedidas causadas pela doença, ou suspeita dela, já correspondem a 7,8% (387) das 4.958 mortes registradas no estado do dia primeiro de abril até as 17h de desta quinta-feira, segundo números do portal da Transparência do Registro Civil, com atualizações em tempo real de cartórios de todo o país. Isso significa que, por dia, houve, em média, 24,1 mortes causadas pelo novo coronavírus ou ainda em investigação. Proporcionalmente, a pandemia já causa tantas ou quase a mesma quantidade de perdas provocadas pelas doenças que mais matam no Rio.
Indicadores do Sistema de Informações sobre Mortalidade (do Ministério da Saúde) apontam que, em 2019, o câncer foi a doença que fez mais vítimas, numa média de 61,2 mortes por dia. O tipo mais letal, de pulmões, traqueia e brônquios, provocou 7,5 óbitos diários, quantidade bem abaixo da média da Covid-19, levando em consideração os registros em cartórios. A doença provocada pelo novo coronavírus também supera, proporcionalmente, as mortes por problemas hipertensivos, com média de 17,5 casos, assim como as provocadas por acidentes vasculares cerebrais, com média de 16,3 registros por dia.
Cemitérios se preparam
E a pandemia não dá sinal de recuo. De acordo com o último boletim da Secretaria estadual de Saúde, até ontem foram 3.944 casos da doença confirmados, com 301 óbitos, 36 a mais que anteontem. Do total de mortes, 172 ocorreram em abril, e ainda há 130 sob investigação — um total menor, portanto, do que o registrado nos cartórios no mesmo período.
Com tantos casos, o movimento nos cemitérios tem sido maior. Na capital, entre 20 de março e anteontem, foram sepultadas ou cremadas 112 pessoas com a doença, além de 114 com a suspeita de Covid-19, de acordo com a Coordenadoria Geral de Cemitérios e Serviços da prefeitura. Esses números representam 7,7% dos 2.919 sepultamentos e cremações do período.
Nos Jardins da Saudade de Sulacap e de Paciência, que são privados, foram 66 sepultamentos este ano pela Covid-19 ou suspeita da enfermidade – pouco mais de 10% do ano inteiro. Só nos 11 primeiros dias de abril, foram 44 casos, o dobro de todo o mês de março.
Diante de um quadro que pode se tornar ainda mais dramático, o Cemitério São Francisco Xavier, no Caju, vai ganhar mais duas mil gavetas para sepultamentos. Nesta quinta-feira, operários trabalhavam na construção das estruturas, e 800 delas deverão estar prontas no início da próxima semana. Embora a administração do local afirme que a expansão já estava prevista antes da pandemia, a concessionária vem tomando outras medidas. Além de mais funcionários no crematório, está mantendo um quadro de reserva para caso haja necessidade de substituir alguém afastado pela doença.
— Desenvolvemos o plano de contingência para atender da melhor forma as famílias, não expondo ninguém a riscos, seguindo protocolos de segurança — diz Sandra Fernandino, porta-voz da Reviver, que administra o cemitério.
Um coveiro do Caju, que não quis se identificar, conta que a equipe se prepara para trabalhar mais. A escala atual deverá ser reduzida:
— Nós estamos cientes sobre um possível aumento no fluxo de trabalho. Hoje, estamos tentando agrupar sepultamentos de casos suspeitos ou confirmados em horários próximos, para que utilizemos as mesmas roupas e equipamentos de proteção, de uma só vez. Tivemos até que reforçar nossos estoques. Estamos com cerca de 200 kits de macacão, máscara e luvas especiais.
Presidente da Associação Brasileira de Empresas e Diretores do Setor Funerário, Lourival Panhozzi se reuniu com os fabricantes de caixões para criar uma reserva técnica.
— Não vamos passar pelo caos funerário vivido na Itália — garante.
Preocupado com as projeções de aumento do número de mortes, o Exército enviou a municípios do Rio e do Espírito Santo um questionário perguntando, em caráter de urgência, a capacidade de as cidades realizarem sepultamentos em massa. Em nota, o Comando Conjunto Leste informou que “planeja sua atuação com base no levantamento de cenários hipotéticos, visando a mitigar os efeitos nocivos da pandemia à sociedade”.
Fonte: O Globo