Esta série "Claves notariais e registrais" −que tem a incentivá-la tanto a Academia Paranaense de Direito Notarial e Registral, quanto a Associação dos Notários e Registradores do Estado do Paraná (Anoreg-PR)− foi idealizada como uma espécie de «festa do direito», uma «eutrapélia jurídica», com o objetivo de tratar de temas do extrajudicial que, num modelo sistemático, não parecem ter espaço adequado.
Com esta perspectiva, dá-se aqui a ocasião de examinar, muito concisamente embora, o termo «tabelião», com o escopo de permitir, até mesmo desde a semântica −com a inclusão da etimologia−, mais claros aspectos de um conceito e de uma realidade que se usam rotineiramente na praxis do extrajudicial.
Saraiva (Dicionário Latino-português, ed. Garnier, 10.ed., Rio de Janeiro -Belo Horizonte, 1993, p. 1.175) indica provir a palavra portuguesa «tabelião» do latim tabellio, tabellionis, reportando-se ao Codex Theodosianus (438 d.C.)., e Rodrigo Fontinha, por sua vez, remete-a a tabellionem (Novo dicionário etimológico da língua portuguesa, ed. Domingos Barreira, Porto, s.d., p. 1.700).
O vocábulo tabellio é um substantivo latino que, segundo Saraiva, deriva de tabella, tabellæ, pequena tábua, tabuinha para escrever, painel em que se oferecia um voto, mas ainda: contrato escrito, testamento, depoimento por escrito (id.); no plural tabellæ, tabellarum: tabuinhas de escrever −cf. Francisco Torrinha, Dicionário latino-português, ed. Porto, s.d., p. 853). Abonam essas indicações Charlton Lewis e Charles Short (in A Latin dictionary, verbum «tabellarius»).
Por sua vez, a palavra latina tabellionem indicada por Fontinha é o acusativo singular de tabellio, e a referência a este caso gramatical justifica-se pelo caráter ordinariamente léxico-genético da língua portuguesa.
O tabellio é, pois, o sujeito que escreve, ou melhor: documenta (tabellio docet…), porque, assim o observou Miguel Fernández Casado, a palavra latina tabulla,æ significa «documento»: é que, diz ele, "en Roma se escribía sobre tablas recubiertas de cera", e o termo tabulla é o diminutivo de tabulla: os romanos "para comunicarse entre sí por escrito, escribían sus cartas en tablas pequeñas" (Tratado de notaría, ed. Imprenta de la Viuda de M. Minuesa de los Ríos, Madri, 1895, tomo I, p. 58).
Havemos de prosseguir com algumas referências históricas acerca do tabellio, mas isto ficará para a próxima explanação, porque agora parece vir à feição aludir a que há outros vocábulos resultantes do latim tabellio; por exemplo, o verbo «tabeliar» (exercer o ofício de tabelião, lavrar atos próprios do tabelião −cf. Fontinha, l.c.); o substantivo «tabelionado» (que equivale ao, no Brasil, mais comum «tabelionato»: cargo ou ofício do tabelião, lugar onde ele desempenha suas funções profissionais); o substantivo feminino «tabelioa», que, além da acepção de «notária pública», tem a de «mulher do tabelião» (ainda uma vez Fontinha, l.c.). Além destes sentidos, a palavra «tabelioa» também se compreende como adjetivo; leia-se o que escreveu a propósito Rodrigo Fontinha: "aplica-se à letra larga, mal feita e encadeada; diz-se das palavras pronunciadas levianamente e por mera formalidade, sem intenção de serem cumpridas".
Continuaremos.