O ITBI – Imposto de Transmissão sobre Bens Imóveis previsto no artigo 156 da Constituição Federal é um tributo de competência municipal que tem como fato gerador a transmissão, ‘‘inter vivos’’, a qualquer título, da propriedade ou domínio útil de bens imóveis. Deste modo, todo município possui autonomia plena para sua regulação, podendo, dentre outros, fixar alíquota, base de cálculo, prazo para recolhimento e multas.
“Art. 156. Compete aos Municípios instituir imposto sobre
II – transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição”.
Assim, exceto em algumas situações específicas, o ITBI incide sobre a transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de (i) bens imóveis, por natureza ou acessão física; (ii) direitos reais sobre bens imóveis, exceto os de garantia e as servidões; e (iii) sobre a cessão, por ato oneroso, de direitos relativos à aquisição de bens imóveis.
O Código Tributário Nacional também regula o ITBI em seu artigo 35, descrito abaixo:
“Art. 35. O imposto, de competência dos Estados, sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos tem como fato gerador:
I – a transmissão, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis por natureza ou por acessão física, como definidos na lei civil;
II – a transmissão, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os direitos reais de garantia;
III – a cessão de direitos relativos às transmissões referidas nos incisos I e II.”
Cabe também destacar a regra prevista no art. 1227 do Código Civil que estabelece: “Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código”.
Nesse sentido, necessário interpretar os dispositivos citados acima. Em todos os dispositivos, é claro e nítido que o fato gerador para incidência do ITBI é a transmissão da propriedade imobiliária, transmissão essa que conforme regra do artigo 1227 do Código Civil se dá tão somente com o registro da transferência imobiliária no Cartório de Registro de Imóveis onde o imóvel está inscrito, ou seja, o fato gerador do ITBI ocorre somente a partir da transferência da propriedade do imóvel que se opera por meio do registro no Cartório de Registro de Imóveis competente.
Essa é a regra mestra de regulação do ITBI. Todavia, existem algumas polêmicas acerca desse imposto, sendo uma delas a incidência ou não do ITBI na cessão de direito decorrentes do compromisso de compra e venda celebrado por instrumento público ou particular.
A polêmica acarreta problemas para os contribuintes, pois é prática recorrente em alguns municípios brasileiros, exigir o pagamento do ITBI sobre a cessão de direitos reais sobre bens imóveis. Entretanto a cessão de direitos reais não pode ser considerada como ensejadora do fato gerador do ITBI, uma vez que referido instrumento não tem o condão de operacionalizar a transferência da propriedade e do domínio de imóveis.
Referido entendimento já restou sedimentado pelo Poder Judiciário conforme abaixo:
“TRIBUTÁRIO- APELAÇÃO E REEXAMENECESSÁRIO – MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO ITBI – MUNICÍPIODE SANTOS – Impossibilidade de lançamento de tributo com base em cessão de direitos aquisitivos – Ausência de fato gerador – No caso do ITBI, o fato gerador só ocorre com a transferência da propriedade, o que só ocorre com o registro no Cartório de Registro de Imóveis – Precedentes do STJ e da C. 15ª Câmara de Direito Público – Sentença mantida – Recursos desprovidos” (Apelação nº 1006236-89.2015.8.26.0562, 15ª Câmara de Direito Público, Relator Desembargador Eurípedes Faim, j. 01.03.2016).”
“APELAÇÃO- CAUTELARDESUSTAÇÃODEPROTESTO – ITBI – Cessão de direitos – Fato gerador que se dá com o registro imobiliário- CTN, art. 35 – CC, arts. 1.227 e 1.245 – Precedentes do STJ e do STF – Indevido protesto da CDA – Sentença mantida – Art. 252 do RITJSP – Recurso desprovido” (Apelação nº 0009725- 97.2013.8.26.0053, 14ª Câmara de Direito Público, Relator Desembargador Octavio Machado de Barros, j. 25.02.2016).”
“Apelação. Ação anulatória de lançamento fiscal c.c. repetição de indébito julgada procedente. ITBI. Lançamento do tributo com base em escritura pública de cessão de direitos possessórios com condição resolutiva. Fato gerador do ITBI que só ocorre com a transferência efetiva da propriedade ou do domínio útil e como registro do ato no Cartório de Registro de Imóveis. Artigos 1.225 e 1.245 do Código Civil. Ausência do fato gerador do tributo. Impossibilidade de cobrança. Precedentes do STF, do STJ e desta Corte. Sentença mantida. Recurso ao qual se nega provimento, com observação quanto aos juros” (Apelação nº 1002026- 51.2014.8.26.0587, Relator Desembargador Ricardo Chimenti, j. 10.09.2015)”
“Ação Declaratória de Inexigibilidade de Débito – ITBI – Escritura de Cessão de Direitos Possessórios – Ausência de registro do título no Cartório de Registro de Imóveis – Fato gerador inocorrente – Precedentes – Sentença mantida -Recursos Improvidos” (apelação nº 1001985-84.2014.8.26.0587, Relator Desembargador Burza Neto, j. 30.07.2015).”
Inclusive o Superior Tribunal de Justiça já pacificou o tema, regulando que “apenas a transcrição do título de transferência no registro de imóveis dá ensejo à incidência do ITBI, não podendo ser tributada a promessa de compra e venda ou de cessão de direitos (RO em MS 10.650-DF, AgReg no REsp 982.625/RJ)”. A ministra Eliana Calmon, ao relatar o Recurso Especial 57.641/PE, entendeu que o ITBI não incide “em promessa de compra e venda, contrato preliminar que poderá ou não se concretizar em contrato definitivo, este sim ensejador da cobrança do aludido tributo”.
Ademais, também o Superior Tribunal Federal, quando do julgamento da Representação 1.211-5/RJ, decidiu no mesmo sentido, sendo a ementa lavrada com o seguinte teor:
“Imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos. Fato gerador. O compromisso de compra e venda e a promessa de cessão de direitos aquisitivos, dada a sua natureza de contratos preliminares no direito privado brasileiro, não constituem meios idôneos à transmissão, pelo registro, do domínio sobre o imóvel, sendo, portanto, inconstitucional a norma que os erige em fato gerador do imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos”.
Dessa forma, conforme pacificado pela jurisprudência, o ITBI não é devido nas operações e contratos que envolvam cessão de direitos sobre imóveis, uma vez que, como destacado acima, este tributo somente tem sua incidência quando da ocorrência da transmissão da propriedade do imóvel, transmissão essa que se dá, nos termos dos artigos 1.227 e 1.245 do Código Civil, com a transferência do domínio do bem imóvel por meio do registro no Cartório de Registro de Imóvel competente.
Caso o contribuinte tenha sido autuado ou tenha qualquer tipo de prejuízo com eventual cobrança, por meio de ações judiciais, é possível discutir e obter a reversão da respectiva autuação ou recolhimento feito, uma vez que, como já apontado acima, o entendimento de algumas Prefeituras está em total desacordo com a legislação e jurisprudência atuais.
*Diego Viscardi é advogado do escritório Machado Associados Advogados e Consultores
Fonte: Estadão