EXCURSO AO TEMA DA CONSCIÊNCIA DO NOTÁRIO E DA CONSCIÊNCIA DO REGISTRADOR: A EDUCAÇÃO DOS CONCURSANTES (parte 9 -conclusão)
Deixei, com um claro propósito, para encerrar este largo capítulo sobre a formação da consciência moral dos notários, dos registradores públicos e dos concursantes a serem notários e registradores, uma referência breve (e um tanto cáustica, admito, mas que é escarmento para todos nós, para mim inclusive) ao que se pode nomear de corrupção dos intelectuais.
Essa corrupção pode ser consequente de uma variedade de causas. Em seu conjunto, essas causas parecem rematar na ideia do sucesso segundo os critérios mundanos: o dinheiro, o poder, as honrarias.
Faz pouco, eu lia esta passagem de Thomas Merton, em A montanha dos sete patamares: "A lógica do êxito mundano se apoia numa falácia; no estranho equívoco de que a nossa perfeição depende dos pensamentos, opiniões e aplausos dos outros homens! Uma vida brilhante precisa sempre refletida na imaginação de mais alguém, como se aí fosse o único lugar em que uma pessoa pudesse finalmente se tornar real".
Existe um tipo de intelectual que bem merece o qualificativo de sofista, porque seu desejo de saber está dirigido pela vaidade. Contra isto, lembram-me aqui umas tantas passagens de A república de Platão; uma que diz: "É absolutamente necessário que, por natureza, um enamorado tenha carinho por tudo que tenha parentesco e afinidade com o objeto de seu amor"; e a outra que bem complementa: "Quem realmente gosta de aprender deve, desde a infância, aspirar à posse de toda verdade" (485 d).
O que se quer dizer é que, ao lado das qualidades intelectuais exigíveis para o saber (entre elas, a boa memória e a moderação no estudo), há uma qualidade moral que deve estimar-se e fomentar-se: que não nos corrompamos pela vaidade, pelo amor fútil de nossas próprias elocubrações.
Álvaro Calderón, de cujas lições nos valemos nos parágrafos anteriores, chega a dizer que "a grande maioria dos intelectuais (…) são maus, (…) porque não têm ou decaem da primeira das condições [morais] exigíveis, da qual brotam as demais: o amor à verdade". E um dos fatores que mais contribuem ao decaimento desse amor à verdade é a falta de resistência à pressão do mundo; daí que devamos evitar, com muito cuidado, a costumeira adulação com que a voz mundana, ainda que alguma vez bem intencionada, trata de convencer-nos a uma vanglória insensata.
Curioso é que este envaidecimento, se é moléstia de variadas idades −num exemplo, pode, com efeito, vitimar jovens concursantes−, é doença que também aflige os velhos. A vaidade, as honrarias, o desejo dos aplausos, de que nos ponham nos primeiros lugares, de que nos reconheçam, et reliqua.
O remédio para isto é uma propositada surdez aos ruídos do mundo. É procurar sempre a contemplação da verdade.