A regulativa de regência para a constituição do bem de família prevê a possibilidade de apresentar-se reclamação contra o pedido de seu registro (cf. arts. 262 a 264 da Lei 6.015, de 1973).
O Código de processo civil brasileiro de 1939 já previra o instituto da reclamação para impugnar a constituição do bem de família, e, com o advento da Lei 6.015, mantiveram-se os mesmos termos expressos do art. 649 desse Código processual. Com efeito, a exemplo do que afora dispõe o art. 264 da Lei 6.015, prescrevia o aludido Código de 1939 que, oferecida uma reclamação, ela se arquivasse no cartório, dela se entregando uma cópia ao instituidor, seguindo-se a suspensão do registro pretendido (caput do art. 651 do Código). O que se veio a acrescentar com o art. 264 da atual Lei de registros públicos foi o preceito de cancelamento da prenotação da escritura institutiva, restituindo-se esta ao solicitante.
Desta maneira, apresentada de modo tempestivo uma reclamação (ou impugnação, como a nomeia Serpa Lopes), é controverso (voltaremos ao tema logo adiante) competir ao registrador avaliar-lhe o mérito, somente lhe cabendo, diz Ademar Fioranelli, verificar a tempestividade: “Basta haver reclamação, por mais absurda ou infundada que seja, para propiciar o cancelamento da prenotação”. E prossegue esse registrador paulista: “Em nosso entender, seria correto tão somente sustação do registro, sem prejuízo da validade da prenotação”.
Eventual falta de reclamação oportuna não prejudica, de qualquer sorte, credor algum, que não perde “seu direito de fazer penhorar o bem de família, se a sua dívida era anterior à instituição” (Carvalho Santos); assim também é a lição de Serpa Lopes: “Ao credor ficam, então, esses dois caminhos: ou empreende a ação necessária para anular a instituição ou promove a penhora do imóvel (…)”.
De lege ferenda, parece bem a sugestão de Ademar Fioranelli, qual a de, alterando-se a parte final do art. 264 da Lei 6.015/1973, afastar-se a referência ao cancelamento da prenotação, desde que se estabeleça um prazo, com ressonância na subsistente eficácia do protocolo, para que o instituidor possa providenciar a supletiva atuação judicial-administrativa ꟷque, hoje, não tem prazo assinado em lei (§ 1º do art. 264: “ O instituidor poderá requerer ao Juiz que ordene o registro, sem embargo da reclamação”).
Parece deva considerar-se implicitado na regra do caput do art. 264 da Lei 6.015 a competência qualificadora do registrador para apreciar a admissibilidade e a pertinência da reclamação ou impugnação, exatamente porque, efetivado que venha a ser o registro pretendido, insista-se, nenhum prejuízo advirá ao credor, mas, recusado esse registro e cancelada a prenotação, assim o observou Valmir Pontes, aparenta ser injusto que, “em razão de mera oposição de terceiro, muitas vezes infundada ou fruto de malícia, erro grosseiro, capricho ou emulação, se deixem o instituidor e sua família expostos a execuções judiciais depois de haver apresentado ao oficial a escritura pública de instituição do bem de família”.
Cabe acrescentar, com saliência, que diante do simples fato da reclamação oferecida não deixam de estar presentes, no processo constitutivo do bem de família, os pressupostos anteriores já examinados na qualificação registral positiva proferida pelo registrador. Somente do conteúdo da reclamação apresentada é que pode emergir alguma coisa contra qualificação positiva precedente, e, pois, não parece faltar à razoabilidade entender admissível o controle material da reclamação pelo registrador.