Bem de família (décima-quarta parte)

Vejamos agora um tanto mais o processo de registro do bem de família no ofício imobiliário.

          O tema vem disciplinado nas regras dos arts. 260 a 265 da Lei n. 6.015/1973, podendo dividir-se em etapas ou fases de: (i) recepção do título (que pode ser uma escritura notarial, um testamento, um formal de partilha ou uma carta de adjudicação); (ii) prenotação do título; (iii) autuação; (iv) qualificação registral; (v) publicação de edital; (vi) registro stricto sensu; (vii) incidentes eventuais: suscitação de dúvida e reclamação.

          Recebido o título, deve ele inscrever-se, lançar-se, apontar-se, anotar-se no livro do protocolo do cartório de registro de imóveis. Ato segundo é o da autuação desse título −numerando-se as folhas dos autos, que devem ser rubricadas pelo oficial do registro. Depois disso, o título deve ser qualificado pelo registrador: (i) positivo que seja o juízo de qualificação, passar-se-á à etapa da publicação do edital; (ii) se, diversamente, a qualificação for negativa, o oficial indicará as razões que entenda obstativas do registro pretendido, propiciando ao interessado o exercício da faculdade de requerer a suscitação do processo de dúvida, que, sendo suscitada, e feitas no livro do protocolo as devidas anotações, prevalecerá a prenotação correspondente até o desfecho definitivo da dúvida.

          Com a qualificação positiva −ou com uma solução de improcedência no processo de dúvida− o registrador providenciará a publicação de edital (art. 262 da Lei 6.015).

          Assim, contanto que não haja, de início, para uma qualificação registral negativaꟷ ou suplantado o obstáculo que houvesse (satisfazendo-se eventuais exigências do oficial do registro imobiliário), o registrador fará a publicação de um edital, “na imprensa local e, à falta, na da Capital do Estado ou do Território” (rectius: Distrito Federal; art. 261 da Lei n. 6.015/1973), edital de que devem consta: I - o resumo da escritura, nome, naturalidade e profissão do instituidor, data do instrumento e nome do tabelião que o fez, situação e característicos do prédio; II - o aviso de que, se alguém se julgar prejudicado, deverá, dentro em trinta (30) dias, contados da data da publicação, reclamar contra a instituição, por escrito e perante o oficial (art. 262).

          O Código de processo civil nacional previa (inc. III do art. 232) ser requisito da citação por edital três vezes fosse ele publicado. Como a Lei de registros públicos omitiu referência  sobre a quantidade de publicações do edital no processo de instituição do bem de família, estabeleceu-se controvérsia sobre a exigência dessa tríplice publicação para bem observar-se o disposto no art. 261 da Lei 6.015.

          Com o novo Código de processo civil brasileiro (2015), o modelo da citação editalícia se tornou, em palavras do saudoso mestre que foi José Manoel de Arruda Alvim, “muito mais simples e econômico”, eliminada a necessidade da publicação por três vezes (art. 257), embora possa admitir-se eventual determinação judiciária de maior número de publicações  (cf. o par.único do art. 257 e a parte final do inc. desse mesmo art. 257).

          Prejudicada atualmente a controvérsia acerca da necessidade das três publicações do edital, é possível, entretanto, discutir-se, à luz da regra do art. 15 do mesmo Código processual de 2015, sobre a faculdade de o registrador de imóveis, empolgando o dispositivo da ampliação eventual das publicações editalícias (par.único do art. 257 do Cód.pr.civ. de 2015), também exigir mais do que uma só publicação do edital no processo de instituição do bem de família. Note-se que a regra processual autoriza a utilização de outros meios de divulgação do edital, além dos jornais, para atender às peculiaridades locais.

          No que diz respeito ao conteúdo do edital, o resumo do título formal e o aviso para fins de impugnação (incs. I e II do art. 262 da Lei n. 6.015) são partes integrantes, ou seja, são partes essenciais da comunicação editalícia, o que não exclui possa o texto do edital ser conciso, desde que permita, razoavelmente, a impugnação por possíveis interessados, o que pressupõe a identificação do instituidor (com a menção de seu nome, naturalidade e profissão) e do imóvel objeto da instituição com suas características reais de determinação e especialidade (não basta uma simples remissão ao número da matrícula), além da referência expressa à data do instrumento notarial ou judicial correspondente, e ao nome do notário que autorizou a escritura ou do magistrado que assinou o título judicial.  Parece indispensável, ao fim, que do edital conste o prazo de 30 dias para eventual impugnação, como sugere este modelo elaborado por Ademar Fioranelli: “Pelo presente edital, fica avisado quem se julgar prejudicado que deverá, dentro do prazo de 30 (trinta) dias, contados da data da publicação deste na Imprensa Oficial reclamar contra a mesma instituição, por escrito, perante o Oficial deste (…) Cartório de Registro de Imóveis (…)”.